Texto escrito por Dudu do Cavaco e Leonardo Gontijo
Hoje é o dia que se comemora o Dia Internacional da Síndrome de Down (Trissomia do cromossomo 21- T21).
A síndrome de Down é uma ocorrência cromossômica natural e universal, que sempre fez parte da humanidade, estando presente em todos os gêneros, raças e classes sociais. Ela afeta 1 em cada 800 nascidos vivos, embora haja variações consideráveis em todo o mundo.
O Dia Internacional da Síndrome de Down foi criado pela Down Syndrome Internacional e é comemorado desde 2006. A data escolhida foi 21 de março (21 / 3) para representar a singularidade da triplicação (trissomia) do cromossomo 21 que causa esta ocorrência genética.
O objetivo do dia é disseminar informações sobre a síndrome de Down e conscientizar a população sobre a importância da promoção do direito inerente às pessoas com síndrome de Down de desfrutar uma vida plena e digna, como membros ativos e valorizados em suas comunidades e na sociedade.
O tema desse ano é “conectar” e nós, do Instituto Mano Down, organizamos um mês inteiro de atividades em todas as frentes, com mais de 100 horas de capacitações e eventos.
Nós gostaríamos de falar de algumas coisas nesse momento tão difícil para todos. Primeiro queremos falar de amor.
Um amor de irmão que transbordou. Temos consciência que o amor liberta justamente porque não suprime individualidades, mas gera o ambiente e as condições para que as pessoas sejam o que são e se descubram na suas potencias , possibilidades e singularidades. Como diz Henrique Vieira: “ Amor é amar , e amar é agir para que o outro possa ser em liberdade.”
Acreditamos que são ações cotidianas que melhoram nossos pequenos mundos, isto é, os ambientes em que vivemos. O amor melhora os pequenos espaços de vida. Amar é se ligar à humanidade sem deixar ninguém para trás.
Amar é não se conformar com o que impede a plenitude da vida do outro. É optar prioritariamente pelas pessoas que são alvos de desigualdades e com poucas oportunidades. Amar é se abrir por um futuro mais pleno , com mais oportunidades.
O amor se revela em pequenas atitudes, é um agente transformador poderoso e sua força está nas pequenas e grandes ações. Isso que acreditamos e praticamos.
Com nosso amor construímos junto com muita gente o Instituto Mano Down que hoje atende mais de 300 famílias de pessoas com deficiência intelectual.
Querermos falar que a normalidade é desumana. Escrevemos no início da pandemia que as pessoas com Down mais velhas vivem uma vida de isolamento social constante, com pouco convites e raras oportunidades.
Urge uma mudança estrutural dentro de nossos corações. Enquanto houver corpos selecionados para ter oportunidades a exclusão perdurará. A tarefa é grande, mas não temos outra opção.
Desde criança recebemos lentes através das quais passamos a olhar o mundo, dar nome e significado a tudo que nos cerca. Então se nossa sociedade oferece lentes Capacitistas elas podem estimular sensações, produzir opiniões e influenciar comportamentos. Capacitistas sem que necessariamente as pessoas se deem conta disso.
Não se trata de culpa, mas de reflexão profunda, sincera e corajosa.
O Capacitismo permeia o olhar e, assim, práticas perversas são naturalizadas e estimuladas. Primeiro se desumaniza a forma de ver para depois se liberar a consciência para estigmatizar, a linguagem para difamar e as mãos para bater.
As pessoas com Down são vistas a partir das diferenças, tão somente. Isso significa que não se reconhecem pontos comuns. A pessoa com Down na largada já passa a ser considerada alguém “digna de dó”, “de coitada” e não como um ser humano cheio de capacidades.
As lentes Capacitistas fazem com que a relação com a pessoa com Down seja mediada pela diferença. Ao ver como diferente de mim acabo me tornando indiferente e me afasto das pessoas com Down. A diferença e a indiferença caminham lado a lado.
O que vai acontecer com as pessoas com Down deixadaos à beira do caminho se eu for mais um indivíduo em silêncio, priorizando minha comodidade, meus privilégios e, por que não dizer, minha segurança pessoal?
Precisamos mexer com as lentes que usamos para enxergar o mundo.
Lutamos para aqueles que só podiam ouvir, comecem a ter voz, ter a própria voz. Todos podem e dever ter voz. Singularmente
Hoje temos empreendedores com Down, professores com Down, atores, profissionais em diversas profissões. Hoje temos 81 pessoas com Down formadas em curso superior no Brasil. Ainda é pouco, nosso convite é ampliar esses horizontes.
Os abismos ainda são gigantescos e somente com atitudes mudaremos esse cenário.
Vale lembrar que :
- Não é novo normal não ter voz.
- Não é novo normal não ter oportunidades.
- Não é novo normal viver em isolamento social eterno.
- Não é novo normal não poder fazer escolhas.
- Não é novo normal aceitar uma sociedade excludente.
- Nós queremos um amanhã melhor. Que a voz das pessoas com Down possa ser respeitada e legitima.
Eu, Dudu do Cavaco tenho voz. Eu me aceito. Eu já driblei várias barreiras, vários nãos e cada dia me sinto mais realizado. Eu adoro ter autonomia e descubro cada dia mais que posso fazer mais. Até 2015 pelo código civil eu não podia casar e esse ano casarei com minha noiva Vitória Rosa. Sei que preciso de ajuda, mas quem não precisa? Eu tenho sonhos e planos e preciso de oportunidades e respeito.
Meu irmão gabaritou a faculdade da vida, gabaritou o não julgamento, e me mostrou que ser você mesmo num mundo que te empurra a fazer e ser o que você não é e gosta é um grande aprendizado.
A cultura da inclusão nos ensina que sucesso não é o que você colhe, é o que você planta.
Agradecemos nossos pais e familiares por sempre acreditarem em nossos sonhos.
A exclusão é um desafio para toda sociedade. Vidas das pessoas com Down importam, todas as vidas são potentes e importam. Que a a lente das oportunidades sobreponha as lentes das barreiras. Vamos nos mobilizar, sair do paradigma da vergonha ao cuidado , da omissão á vontade agir , da vergonha ao orgulho. Convergir lentes e modos de olhares.
Vencemos quando alguém entende que número de cromossomos não dizem quem é você. Que cooperar é também vencer. Fala-se muito em meritocracia, mas as pessoas não terão os mesmos méritos se não tiverem as mesmas oportunidades.
Já avançamos, porém temos muito a avançar. Borá mostrar nossa força. Avante Mano Down. Vamos manter nossa casa e causa viva. Com oportunidades e vacina para todos. Não queremos cidadania seletiva.
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